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Consumo como Destruição

Nas últimas semanas venho remoendo em minha mente reflexões que se costuram através de fontes diversas, a respeito do conservadorismo que se instaura no Brasil, às avessas, através de uma política econômica capitaneada por partidos que ora se intitulavam de esquerda. Não deram conta, essas agremiações partidárias, segundo análises de Vladimir Saflate e de Eliane Brum – dois nomes de peso da intelectualidade brasileira -, de pensar (característica que vem faltando para os tais partidos ultimamente) os impactos não só econômicos, mas éticos, políticos e sociais de suas decisões estratégicas no campo do chamado “desenvolvimento”. Somam-se a essas vozes, mas num tom mais complacente, Frei Betto e Leonardo Boff.

Um vídeo muito bacana produzido pelo projeto “sempre um papo”, com a filósofa Márcia Tiburi, abordando a questão da felicidade, também vai nessa linha. Interpretando a palavra “consumo” como destruição e aniquilamento, a pensadora indica quanto a sociedade do espetáculo, estimulada pela felicidade propagandística, incita a destruição de valores e promove a adesão barata a sentidos efêmeros para a vida. Os bens e objetos perdem seu valor de uso, para adquirirem um valor em si, cultuado e cultivado, inclusive pelas classes populares antes articuladas (ao menos parte delas, nos anos 80) em defesa de seus direitos sociais. Eliane Brum fala do papel da igreja católica e do partido dos trabalhadores, que deram um tiro no pé ao “excomungar” o discurso progressista, este último, enveredando pelo pragmatismo do mercado, sem ao menos avaliar os custos sociais e morais que essa facilitação do consumo (que não gera desenvolvimento algum, diga-se de passagem), promove.

Cidadãos pela metade, os “novos consumidores”, que se localizam nessa “ascensão promovida pela atual política econômica”, tornam-se a base para a acentuação conservadora que, em muitas cidades, deixa de ser fomentada pela classe média “burra”. E os intelectuais da esquerda, calam.

A perda do sentido mais largo de emancipação social e política é, infelizmente, responsabilidade de pessoas e instituições que não assumem seus erros, insistindo numa verborragia econômica sem sentido, despolitizada, brigando com fantasmas que, no fundo, não se localizam no seu rival da oposição, mas dentro de si mesmos. As utopias, que eles afirmam não condizer mais com a pragmaticidade da vida, jogam no lixo de sua própria história. Pior, viram os paladinos do neoconservadorismo, que dizem combater, quando defendem essa forma contemporânea de destruir a consciência política.

Sobre José Renato Polli

Filósofo, Historiador e Pedagogo. Doutor em Educação (FEUSP). Pós-doutor em Educação (FE-UNICAMP), Pós-doutor em Estudos Interdisciplinares (CEIS20-Universidade de Coimbra). Atualmente é Professor Adjunto Permanente no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Sorocaba e Professor Colaborador junto ao Departamento de Filosofia e História da Educação da Faculdade de Educação da UNICAMP. Líder do Grupo de Estudos e Pesquisas em História da Educação Escolar (GEPHEES), da Universidade Sorocaba. Vice-líder do Grupo de Estudos e Pesquisas em Filosofia da Educação (PAIDEIA) e Editor Adjunto da Revista Filosofia e Educação (ambos da Faculdade de Educação da Unicamp). Editor responsável pela Editora Fibra e Consultor Educacional. Autor de 32 livros nas áreas de Filosofia, História e Educação, crônicas e literatura infanto-juvenil.

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