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A Coisa Pública

Após 125 anos da proclamação da república, o Brasil caminha – como é típico dos processos históricos – entre mudanças e permanências. Aqueles que apostam na inexorabilidade do traçado do caminhar do nosso país, rumo a qualquer fracasso ou a qualquer sucesso absoluto, estará inevitavelmente enganado. A história se faz com possibilidades e como dizia Milton Santos, “o futuro são muitos”.

    Não há como negar as contradições inerentes a uma sociedade com estrutura desigual, do ponto de vista do acesso aos bens econômicos e culturais. Uma pequena minoria de famílias concentra o poder sobre o capital, os dividendos da dinâmica produtiva. A força do trabalho, declinada como potencial emancipatório pelos discursos elitistas, ainda se constitui como uma das possibilidades indicadas nos futuros de Milton Santos, embora nunca tenhamos vivenciado tanta exacerbação cruel da alienação política.

   Por outro lado, ingenuidade pensar que o controle do capital se dará inevitavelmente pela força da base da sociedade. Este mesmo capital tem um poder, ainda, cuja energia não se suplantará tão facilmente. Do ponto de vista da estrutura econômica mantém-se uma concentração do poder de decisão por parte de poucos.

   No plano social, apesar de alguns avanços e inclusões, há uma visível e decorrente manutenção da exclusão. Os discursos reparadores, aqui e ali, podem vir tanto dos que desejam efetivamente a mudança, quanto daqueles cuja retórica oca não se consolida. Urge pensar um modelo de educação em que a formação ético-política, sustentada por investimentos humanos e físicos, seja o motor da construção de uma identidade pública nacional.

   Sem romper com os meandros tecnicistas e pragmatistas do tipo de escola que ainda vinga, não lograremos êxito em superar o descaso com o interesse público, moeda corrente do discurso neoliberal. Ao abdicar de uma escola que prepara para uma cultura da valorização do interesse público, continuaremos a experimentar as cisões econômicas e sociais que nos acometem.

   Não que este modelo de escola cairá no colo dos bons cidadãos, interessados em uma sociedade justa e digna para todos. Há muitos interesses que campeiam o controle dos processos educativos. Muito menos essa escola virá por uma “militância” em favor da democracia, que esconde sob seu manto, intenções baixas, contrárias ao sentido de confiança e cordialidade.

   É uma pena que estes valores estejam em segundo plano. Abrindo mão da eticidade e da solidariedade que se constituem como efeitos de poder, devemos aderir à outra eticidade, potencial emancipatório que permitirá reavivar o interesse público.

Sobre José Renato Polli

Filósofo, Historiador e Pedagogo. Doutor em Educação (FEUSP). Pós-doutor em Educação (FE-UNICAMP), Pós-doutor em Estudos Interdisciplinares (CEIS20-Universidade de Coimbra). Atualmente é Professor Adjunto Permanente no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Sorocaba e Professor Colaborador junto ao Departamento de Filosofia e História da Educação da Faculdade de Educação da UNICAMP. Vice-líder do Grupo de Estudos e Pesquisas em Filosofia da Educação (PAIDEIA) e Editor Adjunto da Revista Filosofia e Educação (ambos da Faculdade de Educação da Unicamp). Editor responsável pela Editora Fibra e Consultor Educacional. Autor de 32 livros nas áreas de Filosofia, História e Educação, crônicas e literatura infanto-juvenil.

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