Em 1976 eu era um garoto de 14 anos que adorava frequentar a igreja católica. Participava da vida da paróquia de Santa Teresinha do Menino Jesus, na Vila Rio Branco. Desde os 9 anos me comprazia com aquela mística religiosa, que sempre me perseguiu, até os dias de hoje. Percebi, quando ainda frequentava a comunidade de adolescentes chamada Jubinha, liderada por Jurandir Bianchini, que um jovem espadaúdo, de sotaque português, exercia seu diaconato, acompanhado pelo padre Hamilton José Bianchi, o nosso vigário. Ele tinha participado da nossa comunidade de jovens, a JUBA, anos antes.
De maneira direta, com o fascínio de sua figura concentrada e absolutamente absorta em sua fé, exerceria grande influencia em minha vida. Envolvi-me com a Pastoral Vocacional, quando ele já sacerdote, liderava esse trabalho. Foram diversos encontros, festivais, contatos inesquecíveis.
Aos 23 anos de idade, resolvi ingressar no seminário diocesano. Uma decorrência natural de minha experiência, apesar de tantos percalços anteriores. E eis que aquele jovem diácono estava lá, como reitor do seminário, orientando-me na minha escolha e sem deixar de demonstrar alegria por mim. Tinha uma verve irônica, cômica, mas comedida e sem igual. Cuidava com zelo, tanto do corpo quanto do espírito. Não fossem as aulas que tive com ele, jamais teria obtido sucesso nos meus estudos na faculdade de filosofia, logo após ter decidido deixar o seminário. Ensinou-me o necessário posicionamento metódico diante dos textos e da leitura. Guardo os materiais de suas aulas até hoje.
Sem desejar, por inexperiência, acabei por manter uma dívida com ele até hoje. Arrependo-me deste fato e espero sinceramente que um dia me redima desta falha. Avisei diretamente ao bispo, Dom Roberto, sobre minha decisão de deixar o seminário. O reitor ficou sem explicação.
E eis que me deparo com a notícia de seu passamento. Uma emoção revestida por um marejamento nos olhos tomou conta de mim. Como se um peso nas costas continuasse a me afundar, pela minha infidelidade com aquela pessoa que tanto me influenciou.
Ingressei no seminário em uma época em que primeiro já havíamos acumulado 10 anos de trabalho, namoro e estudos secundários. Não foi uma decisão impensada, nem motivada por pressões culturais. Tudo foi muito consciente, mesmo a opção de abandonar essa escolha. Meu sentido de liberdade não me permitia ter que assumir uma linha de espiritualidade que não me preenchia. Contrariado pela situação, fiz o que meu coração mandou e acho que fiz certo. No entanto, Dom Joaquim Justino Carreira, bispo de Guarulhos, deixou uma marca indelével em minha formação.