Dia primeiro de maio, dedicado aos trabalhadores, coincide com o da morte do campeão Ayrton Senna. Todas as qualidades de Senna como corredor não encobrem o fato de ele ser apenas um ser humano, possuidor também de limitações, que tanto ele se esforçava por superar como esportista. A imagem predominante sobre ele é a de uma grande figura.
Na história da filosofia, ninguém melhor do que Nietzsche apontou as possibilidades humanas, quando criou o conceito de super-homem. Infelizmente, distorceram sua proposta. O nazismo se apropriou da ideia para propor uma raça ariana superior. Ninguém é super-homem em sentido cinematográfico. Pareceria ridículo, levando em conta a humanidade de Senna, questionar seu comportamento, suas crenças religiosas ou políticas, misturar o esportista com suas convicções mais profundas, denegrindo sua imagem e esquecendo-se de seus feitos humanos, demasiadamente humanos, mas importantes.
No dia 02 de maio de 1997, três anos e um dia após a morte de Senna, morria outro brasileiro. Paulo Freire foi preso, expulso do país, amargou 15 anos de exílio e teve o reconhecimento merecido lá fora, enquanto aqui era taxado de comunista, esquerdista, anticristão e tantas outras idiotices. Boa parte dessa infâmia ainda é capitaneada por revistas conservadoras, como a Veja e por pessoas de baixa densidade moral, que se valem dos recursos eletrônicos.
Para tristeza dessa gente, Freire foi alçado à condição de patrono da educação brasileira e é o pai da Pedagogia Crítica, escola com centros de profusão no Brasil e nos EUA. O educador lecionou em Harvard, influenciando grandes nomes da educação americana contemporânea como Michael Apple, Peter Mclaren, Carlos Alberto Torres, Henry Giroux e Ira Shor. Ao não querer perceber a importância de Freire, os seus detratores o desautorizam pelas suas opções ideológicas. Nem por isso, nosso educador maior terá sua imagem arranhada, já que no próprio centro do capitalismo, seu discurso e sua prática educacional se disseminam.
Freire soa como uma voz no deserto educacional. Seu método de alfabetização e sua concepção de educação, centradas no ideário da emancipação plena, vivem a nos interpelar, depois de 17 anos de sua morte, que se completam nesta sexta feira. Propõe cultivar o amor pelo país, pelo mundo, pela natureza e pelos desassistidos. O mesmo amor que talvez todos imaginem emanar daqueles gestos de Senna ao ganhar cada corrida, cada campeonato. Levantando seus troféus, Freire prova que é possível um mundo mais humano e fraterno por meio da educação.