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Me Faz Uma pergunta

Calma, o título do texto é este mesmo. Eu explico. Não há intenções ortográficas tortas. Reflexões são retiradas do inusitado e a memória ajuda. Muitos anos atrás, um amigo que se confundia nas expressões veio com essa tirada: “me faz uma pergunta!”. Obviamente ele quis dizer: “me diz (responde) uma coisa!”. Para quem vive do ensino de filosofia, a fala em questão possui grande pertinência. Na sua confusão oral, meu amigo indicou com sabedoria que filosofar é viver de perguntas.

Sócrates foi o pai da pergunta. Admoesto meus alunos neste aspecto: pensar exige fazer perguntas. A argumentação vale mais que o saber propriamente dito, ou o suposto saber dos que nunca se perguntam. A irmã dileta da pergunta é a dúvida. Não a dúvida metódica de René Descartes, nem a dúvida infinita dos céticos. Mas uma “justa dúvida” diante de “verdades” que nos vendem como se sinônimos de conhecimento. A ignorância se instala devido à ausência de perguntas. Os malfeitores da verdade suprimem a pergunta, pois já possuem as respostas “verdadeiras”. Como dizia o velho Nietzsche (e eu nunca me canso de repetir esse seu aforismo): “não há fatos eternos, como não há verdades absolutas”. Na minha tradução, diria: “não existem fatos, somente interpretações”. Essa simples frase filosófica, tão profunda, carece de aderência nas “reflexões” propostas pelos que pensam que sabem de tudo.

Jostein Gaarden, famoso filósofo norueguês, autor do best seller “O mundo de Sofia”, escreveu em parceria com um grande ilustrador, Akin Düzakin, um livrinho delicioso que se intitula “Eu me pergunto”. O texto consiste num conjunto de perguntas intermináveis, feitas por um garoto, o filósofo do roteiro, sobre temas variados da condição existencial. O belo livro recupera e reforça o conceito filosófico de que o fundamento do conhecimento está na pergunta e não na resposta. Diferentemente do que a as escolas e academias acreditam (o conhecimento está no que já existe sistematizado), transgredindo a “ordem dos fatos” “nietzschenianamente”, a filosofia aposta no inusitado do conhecimento, naquilo que não necessariamente tem a obrigação de partir de algo já dado. Há inovações na história do conhecimento que comprovam essa perspectiva “duvidante” que a pergunta enseja.

Desacreditamos, inclusive, sempre a partir da ótica dos adultos “produtivos” o olhar das crianças, dos jovens e dos idosos. É fato que todos estamos sujeitos às garras da alienação. Mas nossa alienação pode se referir ao fato de supormos saber algo. A falta de abertura para o outro, sujeito da pergunta, nos leva a esta pretensão de verdade. Falha imperdoável das academias! O que fazer? Voltar ao mundo da pergunta, como sempre defendeu o velho Paulo Freire.

Sobre José Renato Polli

Editor responsável

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