Quase um dístico, o conceito atribuído a Pitágoras de Samos pelo grande estudioso F. M. Cornford – utilizado como título desta reflexão – é o parâmetro para a argumentação que desenvolveremos. Lembremos antes de um episódio singularmente anedótico relativo à uma passagem da vida de Tales de Mileto.
Este filósofo, como se sabe, desprezava qualquer tipo de ambição a não ser uma. Como é considerado o precursor dos estudos científicos, conta-se que teria descoberto durante o inverno, pelo conhecimento das estrelas, que haveria uma abundante colheita de azeitonas no ano seguinte. Por esta razão, adquiriu os lagares disponíveis em Mileto e Quios e os sublocou pelo preço que lhe agradava, ficando rico. Esta seria uma demonstração de que os filósofos podem agir para qualquer garantia de êxito prático, mas que, seus interesses são outros.
Poder de qualquer natureza, visibilidade artificial, riqueza material, interesses menores, nunca devem fazer parte de quem realmente se dedica a pensar. Neste quesito chegamos ao centro de nossa questão. Os filósofos se dedicam à teoria. Vivemos um momento de desprezo pelo conhecimento teórico, tido como ineficiente, ineficaz, desconectado da realidade. Ou pior, antônimo da ignorância fascista.
Se Pitágoras, que é conhecido como o pai do raciocínio matemático dedutivo via a teoria como uma “apaixonada contemplação simpática”, o que dizer desta simplificação sobre o que é o pensar, supostamente desconectado do agir? A contemplação, para ele, é intelectual e como dizem grandes filósofos da atualidade, o conhecimento é uma forma de transcendência. Os empíricos, para o grande matemático, podem estar presos ao material, enquanto os que se dedicam à matemática e à filosofia são os que criam um mundo de ordenada beleza.
Feios e simplórios são, por estas razões, os discursos meramente pragmáticos e sem qualidade conceitual. E também as linhas “poéticas” de autores movidos à ignorância e ao ressentimento, além de limitada atuação prática. A teoria enquanto conceito, como nos explica Bertrand Russel, vem de uma origem órfica, mas em Pitágoras toma corpo como uma junção entre contemplação e ciência, tornando-se um objeto transcendental e prático ao mesmo tempo. O ideal contemplativo conduziu à dedução matemática e levou às atividades exitosas, na teologia, na ética e na filosofia.
Os avanços modernos levaram ao pragmatismo e ao instrumentalismo, desprovendo o mundo do conhecimento da perspectiva dedutiva da matemática e do transcendentalismo filosófico. Ou negamos as metanarrativas e desvalorizamos demais a desconstrução, ou extremamos o discurso cientificista. Parece que não é de hoje que as coisas são assim.