Em tempos de confusão entre liberdade de expressão e manifestações linguisticamente apoteóticas, sobretudo em meios virtuais, encontramos um reflexão interessante proposta pelo Papa Francisco na recém publicada Encíclica Laudato Si`: Os meios atuais (de comunicação) permitem-nos comunicar e partilhar conhecimentos e afetos. Mas às vezes, também nos impedem de tomar contato direto com a angústia, o tremor, a alegria do outro e com a complexidade de sua experiência pessoal. Por isso, não deveria surpreender-nos o fato de, a par da oferta sufocante desses produtos, ir crescendo uma profunda e melancólica insatisfação nas relações interpessoais ou um nocivo isolamento.” (LS, 47, p.36)
São várias questões apontadas que nos chamam a atenção. Todas relacionadas à experiência ética. Uma delas diz respeito à manifestação de afetos (ou desafetos). Qual a legitimidade desses sentimentos quando publicizados? Seriam verdadeiros? Frutos de uma indústria da mensagem? São movidos (os desafetos) pelo descompasso psíquico dos usuários? Há sentimentos legítimos, afetos legítimos manifestados por meio das redes sociais? Quanto a esta última questão não tenho dúvida. O problema é de proporção e legitimidade mesmo, porque nem todos os afetos são legítimos e em geral são muitos (afetos e desafetos) que se reproduzem sem parcimônia.
Quanto aos conhecimentos, quais podem ser levados a sério numa selva de informações como as redes sociais? Quais as fontes, as origens das “verdades” que são propaladas aos ventos, sem que incorremos na leviandade? Quais os resultados morais, para nós e para os outros, daquilo que tomamos como verdade e disseminamos? Entre em cena uma outra questão, que é o contato com a realidade do outro, sua experiência pessoal concreta. Tomados por impulsividades, muitos acabam se traindo no papel pernicioso de “manifestar opiniões” a esmo, sem o devido cuidado com a experiência dos outros.
Com razão, o Papa Francisco indica que, a ansiedade exacerbada, um sintoma do modelo de vida que reproduzimos diariamente, faz com que a exposição constante, a necessidade de fazer-se visto, leve aos sofrimentos e insatisfações constantes que marcam a personalidade de muitos de nós. A queixa, sua “livre manifestação” pode caracterizar-se como sinal desse melancólico e pobre tipo de relacionamento que mantemos com os outros, vistos o tempo todo como nossos inimigos, nosso inferno. Daí as agressividades, as ofensas, as calúnias, as difamações e inverdades que são rastros doentios de personalidades fracas, cuja autoestima em frangalhos, expõe-se cotidianamente a olhos vistos, isoladas.