Do Budismo, tomado como referência inicial para esta reflexão, emanam indicações de como o apego pode provocar equívocos. Monja Coen, em um de seus artigos, diz que se alguém procura milagres no budismo, o milagre consiste em lavar seu próprio prato depois de comer. A prática do desapego em relação a tudo que nos oprime é uma premissa desta proposta espiritual. Desapego do egoísmo, do triunfo sobre os inimigos, da fama, dos elogios, dos percalços todos. A líder espiritual ainda sugere que “Se você quer alguém que perdoe suas falhas, deixando-o livre para errar de novo, não procure o Budismo, pois ele lhe ensinará a implacável Lei de Causa e Efeito e a necessidade de uma autocrítica consciente e profunda.”
As causas das dores e sofrimentos, portanto, estão mais relacionadas ao apego a condições, sentimentos e ideias: infelicidade, tensão, teimosia, tristeza, presunção de importância. Uma velha história fala de um diálogo entre um mestre e um discípulo. O mestre ensinara que nunca o discípulo deveria tocar uma mulher. Deparando-se com uma moça em apuros ao tentar atravessar um rio, o mestre a ajudou, carregando-a. O discípulo, confuso, perguntou por qual motivo ele teria feito isso, uma vez que antes dissera que não se deveria tocar uma mulher. O mestre responde que ele apenas ajudou a moça a atravessar o rio, enquanto o discípulo ainda a estava carregando.
O apego nos faz remoer situações, movimentar sentimentos como mágoas e ressentimentos, provocar intrigas e disputas, levar muito a sério as intempéries da vida, sujeitando-nos a elas como se fossem centrais no nosso caminhar. Isso não significa ignorar a existência dos dissabores, críticas, afetamentos, mas aceita-los com naturalidade.
Uma síntese desta orientação pode ser encontrada no dizer evangélico: “não vos preocupeis com o dia de amanhã, pois o amanhã trará suas próprias preocupações.” Qualquer medo, de qualquer natureza, não será curado, como o pavor aos inimigos, como se apregoava com o velho dístico em latim: “per signum crucis, de inimicis nostris libera-nos Deus noster”, mas como muita reflexão.