Há um conjunto de casas geminadas no cruzamento da rua Dom José Gaspar com a rua Dário Murari, na Vila Rio Branco. Durante décadas elas foram propriedade de minha bisavó, Filomena Bedin Leoni. Sua generosidade fez acolher os filhos e netos. Minha avó, Idalina Leoni Polli, juntamente com meu avô, Martinho Polli, já haviam recebido o benefício num casarão antigo com grande quintal, na rua Prudente de Morais, no início de sua vida conjugal. Ali meu pai e meus tios viveram alguns anos, para depois desfrutarem de sua adolescência e juventude nas casas da Vila Rio Branco.
Os irmãos de meu pai, posteriormente, também iniciaram sua vida familiar em duas dessas casas geminadas. Na da esquina, viveram durante alguns anos minha tia Cecília e meu tio Arthur Fachini. Lembro-me disso como se fosse hoje.
Meus tios foram trabalhadores que lutaram a vida inteira para constituir um legado. As pessoas de sua geração são exemplos a seguir. Arthur Fachini, falecido neste último domingo, dia dos pais, foi um desses exemplos. Por um benefício da vida, junto com um de seus irmãos e outros sócios, herdou o destino gerencial de uma das casas mais respeitadas na história de Jundiaí. A Paulicéia, lugar onde pessoas de diferentes matizes ideológicas, culturais, sociais, se reuniam para falar da vida, estabelecer acordos ou simplesmente cultivar amizades durante aquele cafezinho do meio da tarde.
Nos anos em que trabalhei no centro da cidade, via meu tio ali, atrás do balcão, observando a clientela, conversando com as pessoas, administrando os serviços. Os caminhos da vida são misteriosos. As palavras de um sacerdote que celebrou as exéquias de meu tio me surpreenderam profundamente. Revelou para os presentes ter ouvido dele que ele estava muito satisfeito com o que a vida lhe reservara e com o que ele tinha construído. Significativo, em tempos em que muitos parecem não se contentar nunca com o que possuem. Outra fala importante do presbítero veio na sequência. Que apesar da perda da vida material, a espiritualidade (ou a fé) está ligada à permanência do legado por meio da memória. Como historiador, fiquei muito mais surpreso ainda. Ele acertou em cheio. Nossas obras testemunham nossa existência e nossa permanência. Meu tio deixou filhos maravilhosos, netos, bisneto, minha tia querida, noras, genro, cunhados e sobrinhos. Eu sou um dos sobrinhos e fico muito honrado com esta condição. Ele lia com frequência meus artigos. Muitas vezes enviava e-mails comentando. Nossa última conversa foi por telefone, alguns meses atrás. Ficarei com a lembrança carinhosa de sua voz.